sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

A força da amizade



Como podes dizer que não se passa nada? Não são só os outros que tem problemas, ninguém é de ferro….
- Podes sair por favor e fechar a porta? A sério que está tudo bem, obrigado pela preocupação mas só me apetece ficar aqui sossegadinha.
 Acenei com a cabeça e saí do quarto, tinha a certeza de que se passava alguma coisa de muito grave com a minha amiga mas não estava a conseguir ajudá-la.
Quando uma de nós tinha um problema, um dilema qualquer de namoros ou de maridos e filhos, por mais insignificante que ele fosse, sabíamos que a Isabel tinha sempre uma solução, uma palavra certa na hora certa – Isto num grupo de oito amigas que se conhecem desde a infância, já se tornara mais do que normal, ela era a nossa “bengala” era a que estava sempre ali.
Agora todas nós nos sentíamos perdidas, incapazes de encontrar um rumo ou uma solução para o problema.
A rapariga alegre e bem-disposta deu lugar a uma mulher baça, cinzenta, sem brilho. Mas como não conseguimos perceber o que de errado se estaria a passar? Era a pergunta que todas nós fazíamos a nós mesmas.
Esta situação durava há meses, ela estava literalmente a definhar fechada em casa.
A vida tem tanto de belo como de cruel, como é que uma pessoa tão bonita por dentro e por fora, que sempre viveu em função dos outros, que não era injusta com ninguém, estivesse agora assim, viva mas sem viver.
- Madalena, temos de fazer alguma coisa para ajudar a Isa, vim agora de casa dela e não consegui que me dissesse nada, simplesmente mandou-me sair.
- Também já não sei mais que fazer, todas nós lá vamos todos os dias e o certo é que ela continua apática…
Não percebo o que se passa, indignou-se Helena.
- Já pensaram que se calhar é melhor tentarmos contactar os primos dela da Madeira?
- Achas que é mesmo motivo para isso? Perguntou a Sónia.
Ficámos todas em silêncio, estávamos no sítio preferido da Isa, a Boca do Inferno, era final de tarde, o sol estava a pôr-se no horizonte e ouvia-se o rugir das águas revoltas a bater contra as rochas.
As lágrimas apareceram sem avisar nos nossos rostos, faltava ali alguém….
- Posso dizer uma coisa?
- Sim, diz Catarina.
- Ela sempre carregou com os nossos problemas, as nossas aflições, às vezes tão parvas, agora ela precisa de nós e eu já prometi a mim mesma que vou trazê-la de volta à vida, podemos aqui e agora fazer essa promessa?
- Sim claro, respondemos todas em coro.
Fizemos um círculo, unimos as nossas mãos e a uma só voz gritámos num acto de revolta:
- Isabel, amiga, prometemos aqui no teu lugar favorito, que te vamos trazer de volta, custe o que custar.
Nessa noite decidimos que iríamos pegar nos nossos sacos cama e iríamos acampar em casa de Isabel.
A campainha tocou várias vezes até que ela abrisse a porta.
- Ah, são vocês! O que estão aqui a fazer?
Nem lhe demos ouvidos, entrámos para a sala e começámos a dispor os sacos cama pela sala.
- Queres pizza? Trouxemos comida e bebida, viemos acampar por aqui.
Rimos ainda que sem vontade, percebemos que não tomava banho há uns dias e também não havia vestígios de comida na cozinha.
- Não tenho fome, mas já que aqui estão fiquem à vontade, eu vou para o quarto…
- Espera!!! Então vais deixar-nos aqui sozinhas?
- Vá lá Isabel!! Somos assim tão má companhia? Perguntou uma.
- Ou já tens companhia melhor? Retorquiu outra.
Ela lá fez um sorriso amarelo e deu a desculpa que tínhamos escolhido mal o dia porque estava com dor de cabeça.
Depois de ter subido para o quarto, ficámos novamente com o semblante carregado, olhámo-nos em silêncio.
Tínhamos mesmo de colocar o plano de emergência em curso.
Quando o dia amanheceu, arrumámos as coisas e em silêncio tomámos o pequeno-almoço.
A campainha tocou e Isabel gritou para a sala:
- Podem abrir?
Abrimos a porta, claro, já estávamos há espera.
O médico entrou junto com dois enfermeiros, a ambulância aguardava parada à porta pela sua nova paciente.
Indicámos o quarto onde estava Isabel.
Quando saíram, ela ía aos gritos, com os braços imobilizados por correias e agarrada pelos dois enfermeiros.
Estávamos perfiladas à porta da rua, ela olhou-nos nos olhos e suplicou que a ajudássemos, todas baixámos a cabeça.
Ela saiu a chamar carrascos aos enfermeiros e a nós.
Abraçámo-nos, as lágrimas molhavam os nossos rostos, doía muito mas sabíamos ter tomado a decisão certa.


Carla Santos Ramada
06 Fevereiro 2016

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